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Cerromaior

de Manuel da Fonseca

A apreciação que o censor fez desta obra é particularmente cândida, ao considerar que, sem o autor ter de «defender ou atacar qualquer tese», a realidade da vida do trabalhador rural alentejano, tal como ela se apresentava já era suficientemente detestável e, portanto, passível de censura. Não se pode ser mais ingénuo ou mais cínico do que isto!

AUTORIZADO COM CORTES

Ouve aqui trechos da avaliação do censor, lidos por Hugo Inácio

Relatório do Capitão Silva Dias, em 2 out. 1943:

«Este romance, tal como está concebido, não o julgo com possibilidades de ser autorizado.

Sem defender ou atacar qualquer tese ou preceito social, apresenta ao leitor factos concretos que revelam profundas deficiências da estrutura social, entre nós.

A vida dura e miserável do trabalhador rural alentejano, a carência ao mesmo de assistência social, a indiferença do abastado pelo humilde que trabalha em seu proveito, cenas pornográficas e imorais efectuadas por pessoas de melhor condição, são neste romance postas em evidência, podendo concluir-se que o seu autor não mediu os perigos para a sociedade de narrativas (…) que levam os fracos ou os menos preparados a meditações condenáveis.

A descrição da desgraça a que chegou um antigo carteiro, que fôra sempre zeloso e que enlouqueceu e foi levado para uma cadeia, onde morreu sem qualquer protecção da autoridades, dá-nos logo de começo uma má impressão do livro.

Depois espraia-se sôbre a vida angustiosa do camponês, realçando-se as inúmeras agruras dos que vivem da terra, mais parecendo mendigos. As faltas de trabalho, a diferença, doentias [sic], entre o patrão e o trabalhador e também exposições de atitudes indecorosas referentes aos amores clandestinos dum patrão, leva-nos à conclusão que inicialmente escrevi: o livro não deve ser autorizado, tal como é apresentado.

As passagens mais contundentes, eu deixo-as assinaladas nas várias páginas do romance.

Um arranjo com o que fica, julgo tornar-se difícil, pelo sabor anti-social que pode ainda deixar transparecer.»