/ Questionário de Proust

João Ramalho-Santos

Vice-Reitor da Universidade de Coimbra para a área de Investigação, responde a uma série de vinte questões, inspiradas no Questionário de Proust

1.
Qual é a sua ideia de felicidade plena?

Dou duas:

  • Comer uma tosta vegetariana com um copo de vinho branco no Teatro Académico Gil Vicente enquanto leio um livro, antes de ver o filme da sessão de Cinema à Segunda às 21 horas, sentado no lugar C15 da plateia;
  • Contemplar o cedro gigantesco que plantei na quinta dos meus avós paternos quando era miúdo, enquanto brinco à apanhada num dia de sol com a cadela Mali (que não é minha, é de si mesma).
2.
Qual é o seu maior medo?

No mundo? O espalhar da intolerância e desinformação.

Em mim? O medo de não estar à altura.

3.
Que pessoa viva mais admira?

São três. O meu filho Hugo Callebaut (que me educa sobre intolerância), a minha filha Diana Callebaut (que me educa sobre inclusão), o meu irmão mais novo Miguel Ramalho-Santos (que me educa sobre perseverança).

É (muito) rara a pessoa admirável que consiga admirar em tudo.

4.
Qual a sua virtude preferida?

Ser capaz de falar com muita gente, sendo frontalmente teimoso (e utilizando bem o meu sentido de humor).

5.
Que palavras ou frases usa excessivamente?

Advérbios de modo, precisamente.

6.
O quê ou quem é o maior amor da sua vida?

Todas, Todes e Todos os meus amores ficariam aborrecidos se algum dia tivesse de fazer essa escolha. Se fosse MESMO obrigado teria de dizer o Glorioso Sport Lisboa e Benfica. Ninguém (que me conheça) ficaria demasiado ofendido.

7.
Onde e quando foi mais feliz?

Em Portland (Oregon, EUA) entre 1997 e 2000. Investigando sem constrangimentos, e viajando com a Cassia Callebaut, a Diana e a ideia (depois concretizada) do Hugo.

8.
Que talento mais gostaria de ter?

Saber desenhar (faço Banda Desenhada, mas apenas o texto)

9.
Qual considera ser a sua maior conquista?

Ter conseguido vencer (sempre temporariamente) a minha timidez, e utilizado as minhas virtudes (controlando os meus defeitos) para chegar onde estou hoje. Por vezes eu próprio fico admirado com isso.

10.
O que mais valoriza nos seus amigos?

Aturarem-me.

11.
Quais os seus poetas preferidos?

Lawrence Ferlinghetti. “I am perpetually awaiting a rebirth of wonder” é uma das minhas citações favoritas (do poema “I Am Waiting”)

Mas porquê plural, porquê poetas? Nada de música (Sérgio Godinho, Patti Smith)? Nada de arte (René Magritte, Tiago Manuel)? Comigo é mais prosa (“O Livro do Desassossego”) e BD (“As Cidades Obscuras”). E filmes (“Apocalypse Now”, “Paris, Texas”).

12.
Quem é o seu herói ou heroína na ficção?

Acho a noção de “herói” ou “heroína” MUITO limitada. Mas pronto: Corto Maltese.

13.
E os seus heróis ou heroínas na vida real?

Repito o que disse acima. Mas pronto: todas as pessoas que fazem ou fizeram o melhor possível em circunstâncias por vezes impossíveis. Uma só? Julian Assange.

14.
Com que figura histórica mais se identifica?

Com o primeiro primata (cujas ossadas talvez estejam hoje expostas nalgum Museu) que pela primeira vez olhou para o mundo e pensou: “Porquê?”

15.
Qual a personagem histórica que mais despreza?

Lavrentiy Beria, Joseph Goebbels, provavelmente em breve Steve Bannon; gente desse “calibre”. Os auxiliares indispensáveis do pior que fazemos enquanto espécie. Tem a ver com a resposta 2.

16.
Qual a sua ocupação favorita?

Só uma? Ler. Escrever. Ver filmes/séries. Andar a pé.

17.
Qual o seu maior defeito?

Ter dificuldades em falar com pessoas, sendo teimosamente frontal (e utilizando mal o meu sentido de humor).

18.
O que é que gostaria de ser?

Biólogo. Investigador. Professor. Mentor. Autor. Pessoa. É o que tento ser.

19.
Qual é a sua característica mais assinalável?

Temos sempre uma imagem enviesada de nós mesmos. Terão de ser outros a responder. Perguntem, terei curiosidade em saber as respostas…

20.
Qual o seu lema de vida?

“Para ficar no mesmo sítio temos de correr o mais rápido que conseguirmos. Se queremos ir a algum lado temos de correr duas vezes mais depressa do que isso!” Diz a Rainha Vermelha a Alice, em “Através do espelho” de Lewis Carroll. Enquanto o fazemos, devemos estar sempre a pensar na possibilidade de novos deslumbramentos (voltando a Lawrence Ferlinghetti).

Produção e Edição e Conteúdos: Milene Santos, DCOM

Edição de Imagem: Sara Baptista, NMAR

Grafismo: Francisco Elias, NMAR