O “Artifício Que Há De Subir ao Ar”

AA

A. E. Maia do Amaral

Biblioteca Geral da Universidade de Coimbra

Toda a gente conhece a imagem da “Passarola” de Bartolomeu Lourenço de Gusmão. Mas, essa gravura é tardia e feita em parte para desacreditar o inventor ou, segundo outros, para deliberadamente ocultar a aparência dos balões de ar quente que o padre Bartolomeu fez voar, em 1709. O descrédito do “padre voador” começou logo no seu tempo: as experiências aerostáticas perante o Rei, o Núncio Papal e a Corte deram brado em Lisboa, e a “opinião pública” do tempo logo lhe dedicou poesias, jocosas a maior parte, de apoio muito poucas… ontem como hoje.

Esta imagem é muito diferente das outras: existiu num manuscrito da BGUC que para ela deixou um espaço em branco antes do texto “Esta hé a forma do Arteficio que hade sobir ao ar…” (Ms. 342, f. 241v). Digo “existiu” porque já lá não se encontra hoje, perdido o original algures entre 1935 e 1945. Estava provavelmente em papel solto, nunca colado no local que lhe tinha sido reservado (não há vestígios de cola no manuscrito), o que facilitou o seu extravio. Felizmente, tinha sido reproduzida várias vezes, desde 1868, sempre referida como existente no dito códice. A última foi na capa de uma publicação da Biblioteca, a Descripção burlesca de um imaginário aeróstato… (1935), mas já não figura na detalhada descrição incluída no Catálogo de 1945.

Se não é mais verosímil (também não voaria), esta imagem é bem menos fantasista e foi reposta “em circulação” através de um post, de 14 de fevereiro de 2009, do Prof. Carlos Fiolhais no seu conhecido blog de ciência. Porque queremos que seja muito mais conhecida, demos-lhe estatuto de “Domínio Público”, livre de direitos de reprodução. Talvez com esta política de reproduzir, reproduzir, reproduzir possamos ajudar a reabilitar a memória do Padre brasileiro, e retirar-lhe o labéu Deliramenta que lhe dá toda a iconografia mais conhecida, desde meados do século 18. Sobre esta política, continua válido o que escrevi em 2009, que “as bibliotecas hoje podem e devem ser mais ativas na promoção dos seus tesouros, já não se podem limitar a catalogar muito bem os seus fundos e a esperar que alguém os venha encontrar”.

Finalmente, deixem-me ser bibliotecário e dar nota dos manuscritos da época que existem na BGUC com poesias ao padre Bartolomeu Lourenço, porque merecem talvez estudo: um primeiro lote foi transcrito por A. Filipe Simões, depois acrescentado pela Descrição de 1935, que transcreve mais 6 peças, finalmente com mais (e melhores) transcrições na publicação de 2011 (ver Para saber mais). E depois destas tentativas, não é que ainda estão inéditas, umas Décimas à “fugida do P. Bartolomeu Lourenço”, do Ms. 516, f. 209?