E Outras Viagens

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Biblioteca Geral

Universidade de Coimbra

Na “viagem filosófica”, conceito desenvolvido em Coimbra, o exotismo do destino não era o mais importante: Domingos Vandelli tanto mandava os seus alunos de “Filosofia” (ciências naturais) para o Brasil ou Cabo Verde, como para Góis ou a Figueira da Foz, porque o foco nos resultados da observação científica eram o que mais importava para o sucesso da “viagem”.

Hoje, parece-nos inimaginável que, em 1881, uma enorme “expedição científica” tivesse tido por objetivo a Serra da Estrela. Nesse tempo, o Chiado de Lisboa iluminava-se orgulhosamente com 6 candeeiros elétricos Jablochkoff, o telégrafo tinha chegado à Guarda, o comboio a Celorico da Beira (a linha até Vilar Formoso inauguraria no ano seguinte) e quase todo o país já era percorrido por ocasionais “touristes”.

Mas, para a Sociedade de Geographia de Lisboa, coordenada por Luciano Cordeiro, a Serra da Estrela ainda era longínqua e cheia de mistérios: havia quem acreditasse que a Lagoa Escura estava ligada ao mar, velha lenda da qual Melville nos deixou eco em Moby Dick (Cap. 41: "...there was said to be a lake in which the wrecks of ships floated up to the surface...").

Pelas 8 da noite do dia 1 de agosto de 1881, partiam de Santa Apolónia 42 “expedicionários”, comandados pelo próprio Capitão-tenente Hermenegildo Brito Capelo, a que se juntaram em Coimbra Júlio Henriques e 2 funcionários do Jardim Botânico da Universidade. Do Porto, virá Joaquim de Vasconcelos e de Guimarães Martins Sarmento, para integrar a Secção de Arqueologia.

Mais ou menos trajados de exploradores alpinos, espalharam-se pela Serra, Emygdio Navarro, Rodrigo Afonso Pequito, Jules Daveau, Jaime Batalha Reis e dezenas de homens, incluindo um corneteiro de Infantaria n° 12, para acordar o acampamento. O Diário de Notícias ironizava que era "toda a lã de um rebanho em cima de nós! Por sobre isto, revólver para lobos, toucinho para as víboras". Com os homens, seguiram carruagens de material científico, incluindo fotográfico. Entre todos eles, destacou-se o Dr. Sousa Martins (ainda não “santo”) de barrete verde à campino, a atender doentes e a congeminar a construção de sanatórios na Serra, para curar a “tísica” nacional.

Os Relatórios das Secções da Expedição científica à Serra da Estrela foram publicados pela Imprensa Nacional, em 1883. O de Botânica, de que foi relator o professor Júlio Henriques, será o melhor e está disponível na Biblioteca Digital daquele Departamento.