Ousadia(s) para Infringir as Normas...

AB

Ana Maria Bandeira

Arquivo da Universidade de Coimbra

As belas encadernações em pergaminho, com atilhos, com formosas letras desenhadas na lombada, com o título que identifica os livros, não deixam antever os registos que estes livros guardam. E eles são bem reveladores de algumas ousadias de estudantes da Universidade, que ficaram caras a quem as praticou. Leia-se o título da lombada: Confraria de Nossa Senhora 1656 para 1677, identificando o livro onde se recolheram alguns dos exemplos apresentados, em imagens. Integrada na Capela da Universidade de Coimbra, esta confraria devocional e assistencial dedicava-se a apoiar estudantes pobres, a fazer o enterramento dos seus confrades (professores, alunos e funcionários da Universidade) e a auxiliá-los na doença.

A sua origem remonta ao séc. XV, tendo sido fundada pelo Infante D. Henrique, num período em que a Universidade estava sediada em Lisboa. Entre as receitas da confraria, contam-se os donativos recebidos, mas também as multas aplicadas a alunos que ousaram infringir as normas da instituição, seja por desrespeitarem o uso do traje académico, seja por usarem armas. Assim, podemos encontrar as condenações, em dinheiro, por usarem meias de cor, roupas de seda, de cores, ou roupa forrada de seda, por usarem armas proibidas, como adaga, estoque, catana, espada, faca, etc.

A ousadia é aqui entendia como contestação a uma norma imposta ou, por parte de alguns estudantes, como necessidade de sobressair entre os demais, muitas das vezes em afirmação da origem aristocrática que lhes permitia, por possuir pecúlio abastado, a aquisição de roupas caras. Mas o cumprimento da norma era bem controlado e o carcereiro da Universidade, obedecendo aos verdeais e ao juiz conservador, vigiava e identificava quem praticava essas ousadias.

Curiosamente, também o cabelo tinha as suas normas, com a proibição do uso de polvilhos [i.e. pós para o cabelo] e de cabeleira postiça (gadelheira postiça) e o mesmo se passava com o uso de sapatos brancos, certamente mais próprios de salas da corte, do que de salas de aula e do terreiro da Universidade.