Vida em 4 estações

AT

Ana Cristina Tavares

Jardim Botânico da Universidade de Coimbra

A sazonalidade, particularmente refletida em determinados recantos do Jardim Botânico da Universidade de Coimbra, é uma tónica de marca que acompanha e enriquece este Jardim, imprimindo-lhe uma áurea carismática que quase dois séculos e meio de Vida teceram.

Fundado na reforma pombalina, a sua história e a da universidade se intercetam. Em 1731 anuncia D. João V a sua construção, mas é com a outorga dos Estatutos da Universidade pelo Marquês de Pombal que o ‘Horto Botânico’ se torna realidade com a assinatura (fl. 420 do Livro III «Dos Cursos das Sciencias Naturaes e Filosoficas») no Palácio de Nª Sª da Ajuda, a 28 de agosto de 1772. O projeto foi elaborado em 1773 pelos naturalistas italianos Domenico Vandelli e Dala-Bella e pelo jardineiro Júlio Mattiazzi, que "riscou" planos e conduziu as primeiras plantações. Vandelli (1735-1816) foi o primeiro diretor (1772-1791), seguido por Félix de Avelar Brotero (1749-1828). Autor da Flora Lusitanica (1804), na sua direção (1791-1811) findou em 1794 os canteiros lineares da "eschola botânica representada pelo systema de Linneo", o “Quadrado Central”, terraço inferior e o primórdio do Jardim (Figura 1. Quadrado Central em 4 estações).

Esta área mais formal de 4ha, está distribuída por terraços em socalco, instalados nas décadas seguintes, quando concluídos aterros, muros, fontes, lagos, escadas e estufas, sobretudo na direção (1872-1917) de Júlio Henriques. Botânico inovador, defensor do darwinismo e de aulas práticas no laboratório e no campo, fundou a Sociedade Broteriana, intensificou permutas e ensaios (primeiro local da Europa a cultivar a Chinchona), promoveu expedições, reorganizou e atualizou (coníferas e eucaliptos) coleções e plantações, a maioria das árvores emblemáticas que até hoje perduram (Em 4 estações: Figura 2. Jardim Clássico-Quadrado e Escolas; Figura 3. Avenida Central; Figura 4. Alameda das Tílias).

Sucede o botânico Luís Carriço como diretor do Instituto Botânico, que incluía Museu, Herbário e JBUC (1918-1937). Criou as Escolas Completas e Classificadas e das Monocotiledóneas, iniciou a cultura da Vitoria amazonica, enriqueceu o Jardim, sobretudo com plantas africanas, particularmente de Angola, onde veio a falecer (1937), numa das expedições ao deserto de Moçâmedes. Entre 1942 e 1974, Abílio Fernandes foi diretor do JBUC, do Museu e do Laboratório, investigador prestigiado e responsável por muitas intervenções entre 1940 e 1960. Concretizou a construção da Estufa Fria, a ponte para a mata, e a segunda remodelação do Quadrado Central, seguindo a proposta de Cottineli Telmo e Armand Bellinghen (1945): restauros, introdução de topiária de buxo nos canteiros concêntricos e instalação do fontanário, até hoje um ícone do Jardim (Figuras 1 e 2). Além da riqueza histórica e arquitetónica, incluindo múltiplas obras escultóricas, é de realçar o património biológico, relevando-se taxa ameaçados. A mata (Arboretum), densa e diversificada, ocupa 9ha do Jardim Botânico desde o séc. XIX e aqui Júlio Henriques iniciou a plantação de bambus em 1890. Uma capela, ao fundo de um frondoso bambuzal, de cerca de 1ha de Phylostachys bambusoides, conferem ao local um carácter romântico historicista.

No início do século XXI, sob a direção de Helena Freitas, foi desenvolvida a recuperação de sistemas hidráulicos e em 2013, no âmbito do QREN, o projeto de requalificação da Estufa Grande. O Jardim Botânico integrou a candidatura do sítio "Universidade de Coimbra, Alta e Sofia" à inscrição na Lista do Património da Humanidade da UNESCO, confirmada em 2013 e constitui uma Unidade de Extensão Cultural e de Apoio à Formação da Universidade desde 2014. A mata do Jardim reabriu ao público em 2017, e a Estufa Grande em 2018, merecendo o Prémio de Reabilitação Urbana ao autor Arquiteto João Mendes Ribeiro.

Acompanhando as novas valências pelo https://www.facebook.com/JardimBotanicoUC/ o Jardim adaptou-se a tempos de pandemia, lançando o seu conhecimento numa “Viagem ao Mundo das Plantas”, pequenos vídeos mensais, convidando ao 1º Episódio da série, intitulado “Da definição à transversalidade do Jardim Botânico”, em https://youtu.be/jgBzrAGBehY.